Clubes Sociais Podem Restringir Alimentos? STF aponta limites à liberdade associativa
A recusa de permitir a entrada de alimentos ou “marmitas” em clubes sociais vem gerando questionamentos relevantes sobre os limites da liberdade associativa e a potencial violação de princípios constitucionais fundamentais como a dignidade da pessoa humana, a igualdade e o direito ao lazer. Tal controvérsia jurídica foi enfrentada recentemente no Superior Tribunal de Justiça e possui implicações diretas nos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988.
Conflito entre liberdade associativa e direitos fundamentais
Conforme disposto no artigo 5º, XVII da Constituição Federal, é plena a liberdade de associação para fins lícitos. Essa norma protege inclusive a autonomia privada das entidades associativas em estabelecer suas próprias regras internas. No entanto, esta autonomia não é absoluta e encontra limites quando suas normas restringem indevidamente o exercício de direitos fundamentais por seus associados.
No caso específico analisado, um clube recreativo proibia que seus associados ingressassem nas dependências com alimentos e bebidas adquiridos fora de suas instalações. A justificativa apresentada estava relacionada à manutenção de contratos comerciais com empresas terceirizadas que prestavam serviços de alimentação no local.
Posicionamento do STJ: prevalência da dignidade da pessoa humana
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Recurso Especial n.º 2.063.440/SP, firmou entendimento de que clausulas associativas que impeçam a entrada de alimentos próprios devem ser analisadas com base nos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da CF/88).
A ministra relatora Nancy Andrighi ressaltou que a vedação absoluta de entrada de alimentos pode, na prática, excluir pessoas hipossuficientes do usufruto pleno do clube, violando o direito ao lazer (art. 6º da CF) e reforçando práticas sociais discriminatórias, incompatíveis com os valores constitucionais republicanos.
Poder regulamentar versus cláusulas abusivas
É importante compreender que mesmo no exercício de sua autonomia, associações privadas devem observar os deveres de solidariedade e de igualdade material. A ausência de uma alternativa de alimentação gratuita ou acessível dentro do clube agrava ainda mais a discussão, incidindo diretamente sobre o conteúdo do artigo 170, inciso V da Constituição, que trata da defesa do consumidor como princípio da ordem econômica.
- Art. 6º do CDC: Direito à proteção contra práticas abusivas;
- Art. 39, inciso I: Veda impor ao consumidor obrigação excessivamente onerosa;
- Art. 1º, III da CF: Dignidade da pessoa humana;
- Art. 5º da CF: Liberdade de associação (com ressalvas).
Consequências práticas para os clubes recreativos
Com esta arrojada decisão, o Poder Judiciário envia um claro recado às associações privadas: embora dotadas de autonomia administrativa, tal liberdade deve ser exercida sob o manto da juridicidade, estando sujeita à ponderação com os demais direitos fundamentais. A existência de normas internas não pode servir de instrumento para práticas excludentes ou elitistas.
O precedente firmado abre margem para outras demandas similares, inclusive no contexto de eventos esportivos, culturais e religiosos. É imprescindível que os operadores do Direito estejam atentos à jurisprudência constitucionalizada que permeia as relações associativas.
Conclusão: o Direito como equilíbrio social
À luz dos valores constitucionais, a atuação judicial neste caso reforça a função contra-majoritária do Judiciário no combate à discriminação social disfarçada sob a aparência de regras privadas. A decisão do STJ não apenas reafirma o papel dos direitos fundamentais nas searas privadas, como também amplia o escopo de inclusão social nas relações comunitárias.
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Publicado por Memória Forense