Crise Anunciada? Securitização de NPLs expõe falhas regulatórias no Brasil
O mercado financeiro brasileiro está diante de mais um alerta crítico envolvendo a securitização de créditos inadimplentes (Non-Performing Loans — NPLs). No âmago desta questão está o modelo “subprime à brasileira”, que vem se consolidando sob a égide de estruturas flexibilizadas e lacunas normativas. A análise recente publicada pelo Conjur levanta importantes reflexões jurídicas sobre os efeitos sistêmicos e os riscos para investidores, instituições financeiras e para o próprio sistema de justiça.
O que são NPLs e como funcionam as securitizações no Brasil?
Os NPLs são créditos considerados de difícil recuperação, geralmente vencidos por mais de 90 dias, que são adquiridos por empresas especializadas (FIDCs e securitizadoras) com objetivo de empacotá-los e revendê-los no mercado. Este processo é legalmente permitido e estruturado com base na Lei 9.514/1997 (que trata da securitização imobiliária) e na Instrução CVM nº 356/2001, aplicável aos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios.
No entanto, a forma como esses títulos são vendidos, muitas vezes com garantias fracas ou inexistentes, levanta sérias preocupações sobre a legalidade e transparência desses instrumentos financeiros.
A ausência de deveres fiduciários nas operações
O ponto mais crítico apontado por especialistas é a ausência de um verdadeiro dever fiduciário por parte dos agentes securitizadores. Essa omissão repercute diretamente na jurisprudência e também nos princípios constitucionais da boa-fé objetiva e da função social dos contratos, conforme assegurados pelo artigo 421 e seguintes do Código Civil.
Em cenários internacionais como o dos Estados Unidos, a crise de 2008 demonstrou de forma trágica os efeitos de uma securitização desenfreada, pautada exclusivamente por interesses comerciais de curto prazo. No Brasil, a falta de regulação adequada (ou sua ineficácia prática) pode nos conduzir por rota semelhante.
Jurisprudência ainda tímida
Os tribunais pátrios ainda enfrentam desafios para decidir com profundidade sobre os conflitos que surgem das operações de securitização de NPLs. Hoje, temos decisões esparsas tratando da ilegitimidade da cobrança ou da ausência de títulos executivos válidos, mas não há uniformidade.
Decisões recentes de Tribunais de Justiça de São Paulo e Minas Gerais já sinalizaram preocupações quanto à ausência de clareza nos repasses de crédito e nos deveres de informação. Ainda assim, uma súmula vinculante ou orientação do STJ permanece distante.
Riscos sistêmicos e o papel dos advogados
Nesse contexto, os operadores do direito — sobretudo advogados especializados em direito bancário e empresarial — devem estar atentos à complexidade das estruturas contratuais envolvidas nas cessões e às possíveis nulidades por vício de vontade e desinformação.
Além disso, devem observar a responsabilidade objetiva das securitizadoras com base no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, aplicável na maioria dos casos pela natureza da relação jurídica subjacente. Também deve-se atentar à ausência de requisitos legais de transparência, como previstos na Instrução CVM 623/2020, e na Circular Bacen nº 3978.
- Atenção à análise da cadeia de titularidade da dívida
- Verificação do lastro documental e da continuidade jurídica
- Proposta de medidas liminares em caso de cobrança abusiva
- Estudos de viabilidade de ação declaratória de nulidade
Todo esse cenário exige conhecimento técnico, visão sistêmica e análise crítica por parte dos profissionais jurídicos.
Conclusão: há direito em meio à engenharia financeira?
O modelo subprime à brasileira, embora revestido de legalidade aparente, contém elementos estruturais que fragilizam a segurança jurídica. Frente à opacidade das operações, urge que o Poder Judiciário avance na proteção da parte vulnerável e que órgãos reguladores como CVM e Bacen exerçam fiscalização mais efetiva.
Na balança entre lucratividade e responsabilidade, cabe à advocacia agir como guardiã do equilíbrio, garantindo que os interesses de investidores, devedores e do sistema financeiro caminhem dentro de trilhos legítimos.
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Por Memória Forense