Imóvel com dupla finalidade residencial e comercial tem proteção garantida pelo TJ-SC
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) reafirmou, por decisão unânime da sua 2ª Câmara de Direito Comercial, a proteção conferida a um imóvel que, embora utilizado parcialmente como estabelecimento comercial, consiste primordialmente em residência familiar. O julgado reacende debates jurídicos sobre a impenhorabilidade prevista na Lei n.º 8.009/90 e sua aplicação em situações multifuncionais.
Contexto fático e jurídico
No cerne da controvérsia, discute-se se a coexistência do uso residencial e comercial descaracterizaria a proteção legal à moradia. Conforme o processo, o titular do imóvel desenvolve no local atividades gastronômicas no sistema de bistrô, em convivência harmônica com a função de residência.
No acórdão relatado pela desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta, prevaleceu o entendimento de que o imóvel continua resguardado pela impenhorabilidade domiciliar, ainda que abrigue atividade autônoma. Essa interpretação está em consonância com os princípios do direito à moradia e do mínimo existencial, consagrados na Constituição Federal e disciplinados pela Lei n.º 8.009/90, notadamente seu artigo 1º:
“O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza…”
Jurisprudência consolidada dá respaldo à proteção
O acórdão mantém alinhamento com a orientação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que já pacificou o entendimento de que a utilização parcial da residência para fins comerciais não descaracteriza sua função essencial de moradia (REsp 1.196.538/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão). A doutrina também é farta ao defender que a proteção ao domicílio prevalece sobre eventuais prejuízos de credores, salvo fraudes comprovadas:
- STJ, REsp 1.365.464/MG – reconhece a impenhorabilidade do imóvel utilizado para trabalho e moradia;
- STJ, AgInt no AREsp 1551236/SP – reforça a posição de que o uso parcial não descaracteriza o bem de família.
Boa-fé e função social da propriedade
O relator ainda destacou, em voto técnico, que inexiste qualquer indício de má-fé ou artifício para blindagem patrimonial. Pelo contrário: o imóvel serve de moradia ao proprietário e ao mesmo tempo sustenta a renda da família, vocacionando-se à função social protegida pelo artigo 5º, XXIII, da Constituição Federal.
Evidenciou-se, ainda, que a regra da impenhorabilidade não se volta apenas à titularidade do bem, mas ao seu uso efetivamente residencial, o que, no caso, está fartamente comprovado nos autos por fotografias, documentos e depoimentos colhidos.
Implicações práticas para advogados e operadores do direito
A decisão do TJ-SC merece ser observada com atenção por advogados militantes nas áreas de direito civil, empresarial e de família. Em tempos de intensa judicialização relacionada a execução de dívidas, a identificação de bens impenhoráveis exige diligência e sensibilidade jurídica para lidar com a multiplicidade de funções que os imóveis atualmente exercem.
Recomenda-se, inclusive, análise prévia da função do bem, colhendo elementos fáticos e documentais que possam vir em eventual defesa. Esta decisão reforça a importância do princípio da dignidade da pessoa humana como base orientadora da legislação civil contemporânea.
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Por Memória Forense