Mudança na Lei Complementar 214/2023: Exportação que vira Importação?
No cenário jurídico brasileiro, uma recente controvérsia legislativa envolvendo o §3º do artigo 80 da Lei Complementar n.º 214/2023 tem gerado vigorosos debates entre tributaristas e administrativistas. A norma, que previa mecanismos de compensação tributária interestadual relacionada ao ICMS incidente sobre operações de exportação, despertou uma nova polêmica ao permitir o tratamento de certas operações de exportação como reais importações, visando fins de arrecadação e justiça fiscal.
Breve contextualização da norma
Nos termos do artigo 80 da LC 214, são estabelecidos os critérios operacionais e fiscais para regimes de substituição tributária e compensação entre entes federativos. Todavia, o §3º do mesmo artigo estabeleceu a excepcionalidade no caso das exportações que se destinem a terceiros localizados em paraísos fiscais, comumente conhecidas como operações trianguladas.
A redação do mencionado parágrafo afirma que “considerar-se-á como importação, para fins fiscais, a operação cuja destinação final do bem exportado, realizada de forma direta ou indireta, configure retorno ao território nacional ou remessa subsequente a terceiro residente no país”. Tal disposição causou reações por parte da Federação Nacional do Comércio e de operadores jurídicos que alegam inconstitucionalidade material da norma.
Fundamentos da discussão jurídica
Especialistas alegam que há violação ao princípio da legalidade tributária (art. 150, I, da CF/88), bem como ao princípio da imunidade das exportações previsto no inciso X do §2º do art. 155 da CF. A legislação infraconstitucional, ao interpretar essas exportações como verdadeiras importações, estaria promovendo uma dupla tributação ou, ao menos, uma imposição indevida de encargos fiscais.
Enquadramento normativo e jurisprudencial
Do ponto de vista da doutrina, há questionamento sobre o alcance interpretativo permitido ao legislador infraconstitucional para ressignificar institutos tão sensíveis ao comércio internacional. Jurisprudência do STF, como na ADI 4395 e RE 759244 (com repercussão geral), reafirma a impossibilidade de legislar sobre o conceito de exportação de forma a inviabilizar ou desestimular as relações comerciais externas.
Objetivos fazendários x direitos constitucionais
Do lado da Fazenda Pública, sustenta-se o combate à sonegação assistemática e à triangulação abusiva por intermediários localizados em jurisdições de baixa tributação. Ainda que não haja transgressão formal à norma constitucional, a interpretação ampliada do conteúdo do §3º do artigo 80 é um convite a longas batalhas judiciais nos Tribunais Superiores.
- Tipo de tributação afetada: ICMS na exportação
- Natureza da mudança: Conexão com operação internacional de retorno ou redestinação
- Possível afronta: Imunidade tributária e legalidade estrita
Visão crítica e perspectivas futuras
A advocacia deve estar atenta à ampliação interpretativa de conceitos constitucionais com base em leis complementares que enfrentam críticas técnicas. A autuação fiscal baseada neste dispositivo poderá ensejar uma enxurrada de Mandados de Segurança e Ações Declaratórias de Inexistência de Débito Tributário.
A curto prazo, é esperado que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) emitam instruções normativas aclarando os contornos operacionais da medida. Todavia, é imperativo que o STF aprecie a constitucionalidade da norma, a fim de dirimir as crescentes inseguranças jurídicas que assolam as operações de comércio exterior no Brasil.
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Memória Forense