Direito autoral em xeque: a criação por IA pode ser de quem escreveu o prompt?
O avanço exponencial das inteligências artificiais generativas tem desafiado fundamentos centrais do Direito Autoral. A recente análise publicada pela jurista Marisa Maio no Conjur levanta questionamentos complexos sobre a titularidade de obras geradas por IA, especialmente em torno do papel do autor do prompt — o indivíduo que, ao redigir comandos precisos a uma IA, direciona a criação da obra.
O paradoxo da autoria na era tecnológica
A tecnologia tem habilitado máquinas a criarem textos, imagens, vídeos e composições que se assemelham, em forma e conteúdo, àquelas feitas por humanos. No entanto, o artigo 7º da Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98) é taxativo ao delimitar que apenas as criações do espírito humano podem ser consideradas obras protegidas pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Nesse cenário, surge a indagação: quando uma obra é gerada por IA a partir de um comando humano criativo, há ou não criação humana protegível? Esse é o cerne da discussão proposta por Marisa Maio, que pode reconfigurar fundamentos jurisprudenciais e doutrinários do país.
Prompt engineering como gesto criativo
Segundo a autora, o prompt engineering — a arte de escrever instruções detalhadas para gerar resultados específicos em inteligência artificial — pode ser equiparado a um gesto criativo, embora indiretamente. Assim, a questão jurídica repousa sobre até que ponto essa intervenção humana é suficiente para configurar uma nova forma autêntica de autoria.
Discussões semelhantes ocorrem internacionalmente. A U.S. Copyright Office já sinalizou que obras geradas por IA não são protegíveis, a menos que demonstrem uma contribuição humana substancial. No mesmo sentido, países como Inglaterra e Austrália têm flexibilizado esse entendimento, incluindo a figura da autoria computacional.
Remuneração e crédito: direitos conexos emergem?
Ao redor da ambiguidade sobre autoria, outro dilema jurídico se estabelece: o direito de remuneração. Mesmo não detendo o direito autoral em sentido estrito, o criador de prompts pode reivindicar um tipo de direito conexo, similar ao dos intérpretes e produtores fonográficos, conforme analogia das hipóteses do artigo 5º da Lei 9.610/98.
Esse tipo de reconhecimento abriria caminho para contratos de distribuição de royalties sobre obras híbridas (humanas e computacionais), exigindo revisões na legislação atual e a construção de nova jurisprudência. Como observado, o Judiciário brasileiro ainda não enfrentou diretamente essa controvérsia, mas é apenas uma questão de tempo.
Desafios práticos e regulatórios
Considerando que os modelos de linguagem generativa são treinados usando vastas bases de dados extraídas da internet — muitas vezes sem licença ou consentimento —, há também o risco de colisões com os direitos autorais de terceiros cujas obras tenham servido de inspiração para a saída da IA.
O artigo também alerta para a ausência de regulação específica, o que gera um vácuo jurídico perigoso e sujeito a interpretações oportunistas, prejudicando advogados e juristas na defesa dos direitos de seus clientes.
Demandas do futuro: o que os tribunais precisarão julgar
- A titularidade legal das obras geradas por IA com base em prompts criativos;
- A configuração de autoria compartilhada entre humano e IA;
- A possibilidade de remuneração ou royalties ao criador do prompt;
- A responsabilidade legal por plágio ou infração de terceiros;
- A reinterpretação legislativa do conceito de “obra” e “autor”.
O impacto da IA na produção artística, científica e literária desafia não apenas os profissionais da área jurídica a reverem conceitos sedimentados, mas também exige do legislador um novo olhar normativo sobre o futuro da propriedade intelectual no país.
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