Uso da Bíblia como material didático reacende debate sobre laicidade e direitos fundamentais

Uso da Bíblia como material didático reacende debate sobre laicidade e direitos fundamentais

Uma decisão da Secretaria de Educação do Estado do Amazonas reacendeu intensos debates jurídicos e sociais em todo o país: a autorização do uso da Bíblia como material didático complementar nas instituições públicas de ensino fundamental. A medida, publicada no Diário Oficial do Estado no início de junho de 2025, levantou reações de juristas, especialistas em educação e defensores dos direitos da criança e do adolescente.

Conflito com o Estado Laico

O Brasil, enquanto Estado laico conforme preceitua o artigo 19, inciso I da Constituição Federal de 1988, não pode estabelecer cultos religiosos ou igrejas oficiais. Dessa forma, a adoção institucionalizada de um conteúdo de natureza religiosa em escolas públicas deve ser cuidadosamente examinada sob a ótica do princípio da laicidade, que garante a separação entre o Estado e as organizações religiosas.

Embora o ensino religioso seja permitido no âmbito público, de forma facultativa e plural, conforme indicado no artigo 210, §1º da Carta Magna, a adoção específica da Bíblia como material didático levanta um questionamento fundamental: estará o Estado promovendo de forma velada uma determinada religião?

Criança e Adolescente: Proteção Integral como Princípio Constitucional

O princípio da proteção integral e absoluta da criança e do adolescente, conforme o artigo 227 da Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), exige que todos os atos relacionados à infância e à adolescência atendam prioritariamente aos seus interesses e direitos fundamentais, inclusive o direito à liberdade de crença.

Nesse ponto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal orienta que a neutralidade religiosa das escolas públicas deve ser respeitada, garantindo-se o pluralismo de ideias e o desenvolvimento de uma consciência crítica baseada em valores democráticos e inclusivos.

Posicionamento Jurídico e Possíveis Ilicitudes

Adotar a Bíblia como material complementar obrigatório pode colidir com os princípios da administração pública (legalidade, impessoalidade, moralidade) insculpidos no artigo 37 da Constituição Federal. Além disso, ao privilegiar determinada crença, o Estado possivelmente viola o pacto internacional sobre direitos civis e políticos da ONU, incorporado ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto 592/92, que garante o direito à liberdade de religião e convicção, inclusive no ambiente escolar.

Precedentes e Riscos para Políticas Públicas

Há precedentes judiciais relevantes que reforçam esse entendimento. No julgamento da ADI 4439, o STF decidiu que o ensino religioso em escolas públicas deve possuir caráter não confessional. Assim sendo, qualquer iniciativa que implique favorecimento de determinada doutrina pode ser considerada inconstitucional, especialmente se afetar crianças em estágio de formação crítica e ética.

A jurisprudência do STJ também alerta para os riscos de violação ao princípio do melhor interesse da criança no uso de materiais que possam doutriná-las em vez de instruí-las.

Considerações Finais

A adoção da Bíblia como material didático em escolas públicas exige uma análise jurídica profunda e criteriosa alinhada aos princípios constitucionais e ao arcabouço normativo protetivo da infância. Não se trata apenas de garantir neutralidade religiosa, mas de assegurar o pleno desenvolvimento ético, cultural e intelectual de todos os alunos sem segregação ou imposições ideológicas.

É imperativo que advogados, promotores, educadores e defensores dos direitos fundamentais acompanhem de perto medidas como essa, pois nelas repousam os fundamentos de uma sociedade pluralista e democrática.

Se você ficou interessado na laicidade escolar e deseja aprofundar seu conhecimento no assunto, então veja aqui o que temos para ocê!

Por Memória Forense

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