O papel das fundações no Direito Alemão: implicações e lições ao jurista brasileiro
Em um período marcado pela transformação institucional e crescimento das entidades do terceiro setor, o aprofundamento da compreensão jurídica sobre fundações revela-se de suma relevância. O Direito Alemão, referência normativa em direito comparado, fornece bases avançadas para refletirmos sobre o papel, estrutura e regime jurídico das fundações privadas. Esta análise apresenta as contribuições da Parte 2 do artigo publicado no Conjur, com um enfoque crítico e jurídico voltado ao profissional do Direito.
Fundamentação Constitucional e Autonomia Privada
Na Alemanha, as fundações gozam de forte proteção constitucional, especialmente pelo Artigo 14 da Grundgesetz (Lei Fundamental Alemã), que assegura o direito à propriedade, e pelo Artigo 2, que garante a liberdade geral de atuação da personalidade jurídica. Tal proteção permite a existência de fundações com alto grau de autonomia, especialmente na definição de seus fins e na sua perpetuidade, mesmo após a morte do instituidor.
Esses fundamentos consolidam o conceito de “autonomia privada institucionalizada”, tornando as fundações verdadeiras expressões da vontade social, geridas por órgãos próprios, mas com fiscalização estatal subsidiária.
Exigências legais e controle estatal
Enquanto no Brasil há certa flexibilização na criação e fiscalização das fundações, o sistema alemão é mais rígido e detalhado. Antes do reconhecimento estatal, exige-se:
- Um estatuto bem definido, com finalidade legal, sem fins lucrativos;
- Capacidade patrimonial suficiente para assegurar a perpetuação da fundação;
- Verificações de legalidade material e formal pela autoridade competente do estado federado (Bundesland).
Somente após ultrapassados esses critérios é que se concede personalidade jurídica à fundação, nos moldes do §80 do Bürgerliches Gesetzbuch (BGB – Código Civil Alemão).
Implicações para o Direito Brasileiro
O ordenamento brasileiro, disciplinado pelo Código Civil (Lei 10.406/2002), em seus artigos 62 a 69, estabelece parâmetros gerais sobre fundações, mas carece de uma normatividade mais profunda e técnica como a encontrada na Alemanha.
A adoção de critérios mais rigorosos, inspirados no prédio normativo alemão, propiciaria maior segurança jurídica, estabilidade patrimonial e fidelidade ao fim social estipulado. Os precedentes do STJ e do STF, no que tange à curatela institucional e tutela do patrimônio destinado à finalidade fundacional, poderiam ser enriquecidos com uma perspectiva comparada.
Fins Sociais e Benefícios Públicos
As fundações alemãs somente são legitimadas se seus objetivos forem voltados ao interesse coletivo. Isso conduz a uma rigidez ética e pragmática capaz de evitar fundações de fachada. Tal estrutura favorece o surgimento de institutos de pesquisa, promoção de cultura, ações educacionais e científicas com forte potencial de prestação de contas à sociedade e sustentabilidade jurídica.
Elementos de governança e desafios atuais
O modelo germânico impõe diretrizes mínimas de governança, determinando composição do conselho, regras de substituição, fiscalização e padrões contábeis. O desafio atual repousa no dilema de modernizar essas obrigações à luz da digitalização sem perder o rigor jurídico.
No Brasil, os recentes casos envolvendo fundações universitárias e o desvio de suas finalidades originais tornam evidente a necessidade de reformas institucionais, fiscalização qualificada e convergência sistêmica com modelos mais maduros como o alemão.
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Assinado: Memória Forense