Reforma do Código Civil: Entre o Ideal Jurídico e os Dilemas Empresariais
Na complexa interseção entre doutrina, jurisprudência e interesses econômicos, a proposta de reforma do Código Civil brasileiro de 2002 tem despertado debates acalorados no meio jurídico. Publicado originalmente em abril de 2025 no site Consultor Jurídico, o dossiê promovido pelo Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos da Infraestrutura (IBEJI) revela o intenso embate entre os princípios acadêmicos de sistematização normativa e a realidade dinâmica das relações empresariais.
O cerne da reforma: técnica jurídica versus prática empresarial
A proposta do Senado, originada por um grupo de juristas nomeado por Rodrigo Pacheco, objetiva atualizar dispositivos centrais do Código Civil com foco em contratos, responsabilidade civil, estrutura societária e prescrição. Contudo, setores empresariais apontam para uma possível “reburocratização” das relações privadas, gerando insegurança jurídica. Tal choque revela uma tensão clássica entre a tradição codificadora influenciada por Pontes de Miranda e a fluidez contratual do Século XXI.
Impactos nos contratos empresariais
Um dos principais pontos de crítica reside na tentativa de detalhamento excessivo das obrigações contratuais no novo texto. Empresários e advogados do setor relatam que tal enfoque pode comprometer a flexibilidade negocial, pilar essencial do princípio da autonomia privada previsto no art. 421 do CC. A preocupação também se estende ao art. 422, que trata da função social do contrato, ampliado na nova proposta, potencialmente abrindo margem para interpretações mais intervencionistas.
Revisão dos prazos prescricionais: ganhos ou riscos?
A alteração nos prazos de prescrição, com simplificações e supressão de prazos intermediários, busca clarificar o direito material. No entanto, há o receio de eventuais lacunas interpretativas quanto à retroatividade da norma, tema já enfrentado apenas parcialmente pela jurisprudência do STJ (REsp 1.281.594/MG). O art. 205, que prevê o prazo prescricional de dez anos quando a lei não disponha de forma diversa, poderá sofrer ajustes, afetando significativamente setores como o imobiliário e o bancário.
Sociedades e responsabilidade patrimonial
Outro capítulo da reforma aborda a estrutura de sociedades, especialmente na responsabilidade dos sócios. A proposta tende a reforçar a responsabilização solidária em determinados casos, sob o argumento da prevenção contra abusos. Entretanto, advogados da área comercial alertam para possíveis violações ao princípio da separação patrimonial (art. 1.024), o que pode desencorajar a constituição de sociedades limitadas por pequenos empreendedores.
Uma reforma acadêmica com efeitos concretos
O estudo conduzido pelo IBEJI aponta um vício de origem: a proposta decorre majoritariamente de núcleos acadêmicos e magistrados, sem ampla consulta prática com a advocacia e setores produtivos. Juristas como Cláudia Lima Marques e Carlos Edison do Rêgo Monteiro Filho defendem a necessidade de calibragem entre o ideário civilista e as exigências do mercado, sob pena de criar uma legislação que privilegia a teoria em detrimento da aplicabilidade.
Possíveis caminhos: diálogo e participação social
A experiência democrática brasileira ensina que qualquer reforma estrutural requer diálogo multidisciplinar. O art. 5º, inciso XXXIV, da Constituição Federal garante o direito de petição, o que tem motivado entidades como a OAB e o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) a se manifestarem formalmente no processo legislativo, reivindicando maior transparência e participação na redação final. A futura codificação não pode prescindir do protagonismo da advocacia, sob pena de ineficácia prática.
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Por Memória Forense